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Cadernos LabRI/UNESP - Núm. 12 · ISSN 2764-7552

A Atuação do Conselho de Segurança das Nações Unidas em relação à COVID-19

Por Jonas Vieira, Leonardo Landucci, Mayara Zorzo

No atual momento em que se encontra a crise global gerada pela pandemia do novo coronavírus, tornou-se evidente a importância de atuações políticas eficientes...

No atual momento em que se encontra a crise global gerada pela pandemia do novo coronavírus, tornou-se evidente a importância de atuações políticas eficientes. Tal importância pode ser avaliada através de comparações entre diferentes reações de líderes políticos frente à pandemia e as respectivas consequências geradas ao seu país. Como um exemplo da falta de responsabilidade governamental, pode-se citar o Estados Unidos - responsável por manter uma política negacionista no início - que atualmente é o novo epicentro da doença, possuindo o maior número de casos confirmados e de mortes.

Frente a isso, a atuação de organizações internacionais (OIs) se coloca, também, como essencial. Dentre elas, destaca-se o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), o órgão com poder decisório da Organização das Nações Unidas (ONU), o qual é formado por 15 países membros: 10 rotativos (com eleições a cada 2 anos) e 5 permanentes (Estados Unidos, Reino Unido, China, Rússia e França, ou “grupo do P5”).

De acordo com o artigo 24 da Carta da ONU (1945), o CSNU é responsável pela garantia e manutenção da paz e da segurança no mundo, e seus membros devem aceitar como também executar as ações que forem determinadas durante as reuniões do mesmo. Dentre as principais formas de atuação do órgão está a organização de reuniões entre as lideranças políticas e as missões de paz da ONU, objetivando o cessar-fogo de zonas conflituosas, com o objetivo de levar à cabo esforços políticos que possam resolver as hostilidades entre as partes envolvidas por via diplomática.

Durante o presente cenário de incertezas que a comunidade internacional se depara, a atuação e posicionamento do CSNU são de extrema importância, visto que, atualmente, algumas regiões são vítimas de conflitos armados, gerando danos irreparáveis à população local, o que tende a ser potencializado pela disseminação do novo coronavírus, a COVID-19, já que estas pessoas em sua grande maioria vivem na extrema pobreza e sem acesso a tratamento médico básico. Deste modo, faz-se necessária uma cooperação entre os vários órgãos da ONU, sobretudo, entre a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o CSNU.

Desde o início da pandemia, críticas negativas emergiram direcionadas ao CSNU por parte de especialistas e diplomatas. Sua ineficiência e indisposição para tratar do assunto demonstravam a forma como o mundo viria a lidar com a questão: sem cooperação e com “troca de farpas”. De um lado, a China defendia que o tema estaria fora do escopo do CSNU, não cabendo, portanto, a discussão em seu âmbito, por outro lado, os Estados Unidos sinalizaram que era necessário discutir o surgimento do novo vírus, pois acusam o mesmo de ter sido criado em laboratórios estatais chineses. Este impasse, como exposto pela Reuters (2020) dificultou qualquer tipo de ação por parte do órgão da ONU.

Essa discussão levantou a necessidade de um posicionamento oficial do embaixador chinês na ONU, Zhang Jun, frente ao CSNU. Visto que ele reforçou a importância da cooperação frente à COVID-19 e do fim da tentativa estadunidense de rotular a doença como “vírus chinês”, como exposto pelo presidente dos EUA, Donald Trump, em entrevista. Outro importante e conflitivo parecer dado perante à ONU foi o de António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, cujas palavras reforçaram a necessidade de uma ação do CSNU frente ao coronavírus, justamente no sentido de aliviar as ansiedades e tensões causadas pela falta de iniciativa e cooperação.

Após a crise diplomática entre Estados Unidos e China ter sido reduzida em prol de uma ação do CSNU e, por insistência alemã, foi marcada a reunião e dois textos estariam entrando em discussão. O primeiro foi movimentado pelos países com cadeiras não-permanentes no CSNU, seu conteúdo havia sido mobilizado pela Tunísia e consistia em um cessar-fogo imediato dos conflitos mundiais em prol de uma ação coordenada, visando a contenção da COVID-19. O segundo surgiu por iniciativa da França, com intuito de cessar hostilidades temporariamente ao redor do globo. Esse texto fomentou controvérsia, precisamente por privilegiar o grupo P5, dividindo a união, já fragilizada, entre os países com cadeiras permanentes e rotativas.

Em ligação privada, posteriormente divulgada à mídia, os presidentes russo e francês, respectivamente Putin e Macron, anunciaram o desejo pela realização efetiva de uma reunião com os membros do P5, acerca da COVID-19, e também do próprio Conselho de Segurança como um todo. Em meio aos posicionamentos sobre a necessidade do encontro e a emergência da pauta, tanto o documento da Tunísia quanto o da França deram forma a um novo rascunho que conteria um plano de ação formal para a minimização dos danos, dentro dos limites de escopo do órgão.

Portanto, na última quinzena de abril, o CSNU se reuniu por videoconferência para discutir, principalmente, o impacto que a pandemia da COVID-19 pode trazer às sociedades de países com os sistemas de saúde pulverizados em decorrência de longos anos de guerras civis, como, por exemplo, Líbia, Afeganistão, Iraque, Síria, Sudão e Iêmen. Dessa forma, o CSNU objetiva pedir por meio de um projeto de resolução, que os beligerantes em conflitos imponham um cessar-fogo, ou “pausa humanitária”, de 90 dias. A medida visa facilitar a entrega de ajuda humanitária , sem que ela encontre obstáculos e seja feita de forma segura.

António Guterres em fala dada aos jornalistas, no dia 30 de abril, afirmou ter recebido o apoio sobre a proposta de cessar-fogo de 114 governos, organizações regionais e líderes religiosos, além de 16 grupos armados. Segundo ele, os esforços para o fim das hostilidades dependem de apoio político e afirma ter “esperança que o Conselho de Segurança será capaz de encontrar unidade e adotar decisões que ajudem a tornar o cessar-fogo uma realidade”.

Todavia, a resolução não implica o cessar-fogo às operações militares contra o Estado Islâmico, Al-Qaeda, Al-Nusra e qualquer outro grupo listado como terrorista pelo CSNU. Um outro ponto-chave, é que o chefe das Forças de Paz da ONU, Jean Pierre-Lacroix, defendeu que os “capacetes azuis” sejam mantidos em solo para trabalhar coordenadamente com os governos dos países em conflito na luta contra o coronavírus. Reiterou, também, que o CSNU está dando suporte multifacetado aos Estados:

Estamos facilitando comunicações remotas graças a nossos meios tecnológicos, estamos ajudando a garantir que cadeias de suprimento críticas sejam mantidas e nosso pessoal está alertando as comunidades sobre o coronavírus, através de plataformas de rádio local e mídia digital, assim como durante o patrulhamento.

O Iêmen é um dos países que mais geram preocupações à ONU. Martin Griffiths, enviado especial da ONU, disse ao Conselho de Segurança, que o Estado não pode sobreviver à uma guerra travada simultaneamente em dois frontes: uma bélica e outra pandêmica. Pois, a guerra civil no país que já dura mais de 5 anos, pulverizou a infraestrutura de saúde, o sistema imunológico da população e contribuiu para a proliferação de diversas outras doenças, como, por exemplo, a cólera.

A Guerra Civil Iemenita (2015-presente) teve suas origens na Primavera Árabe, quando o presidente autocrático do país, Ali Abdullah Salleh, foi deposto após quase 32 anos à frente do governo, delegando o poder ao vice-presidente, Abdrabbuh Mansour Hadi. O conflito está centrado em torno de dois grandes grupos: a coalizão formada pelos apoiadores de Hadi (EUA, Reino Unido, Arábia Saudita e outros 8 países árabes) e os hutis, grupo apoiado pelo Irã de minoria xiita zaidi, que aproveitou da debilidade do novo presidente para tomar o controle da Província de Saada e de suas zonas limítrofes. Segundo dados do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o conflito iemenita levou o país à extrema pobreza, na qual 22,2 milhões de pessoas (75% da população) necessitam de ajuda humanitária imediata para sobreviver, já que sofrem de insegurança alimentar e desnutrição. Outro grande problema, é que somente 50% das instalações sanitárias do país funcionam completamente - mais de 16,4 milhões de pessoas não têm acesso à assistência médica básica.

Devido a esse cenário caótico, a OMS teme que o novo coronavírus esteja circulando ativamente no país, podendo contaminar mais de 50% da população, o que seria catastrófico para o precário sistema de saúde. Duas mortes já foram registradas no sul do Iêmen, região mais afetada pela guerra. Na mesma entrevista dada por Guterres, ele disse que “há uma oportunidade de paz” no Iêmen, visto que a Arábia Saudita declarou um cessar-fogo unilateral e finalizou dizendo que “é hora de reconhecer que o povo iemenita já sofreu demais”.

Porém a resolução de cessar-fogo ainda carece de votação no CSNU, e encontra barreiras nos EUA e na Rússia, pois ambos temem que ela possa prejudicar o andamento das operações militares anti-terroristas de seus governos. O primeiro, quer manter o direito de ataque das posições pró-Irã no Iraque, e por sua vez, a Rússia, a manutenção de sua presença militar na Síria e apoio dado às milícias não estatais líbias.

Desse modo, é possível concluir que a presente pandemia tem gerado impactos aos diferentes setores, tanto dos Estados, quanto das Organizações Internacionais e, portanto, a coordenação eficiente e detalhada de ações políticas, econômicas, sociais e sanitárias se torna essencial e é, atualmente, a melhor forma de encontrar soluções para que menores danos sejam causados a populações de todo o mundo e para que, também, vidas possam ser poupadas.

Referências Bibliográficas

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